• “A alma não se rende ao desespero sem haver esgotado todas as ilusões”
  • # Décimo Quinto -

    domingo
    - Sofia acorde - Falou sua mãe, já era nove horas e ela tinha que levantar.
    - Ah, mãe! Me deixa dormir! Que saco! - Sofia respondeu. Ela não queria ir viajar...
    - Levaaanta!
    - Já tô levantando, olha só... tô de pé! Feliz agora? - Respondeu com sarcasmo.
    Naquele dia  Sofia ia para a casa de uns irmãos da mãe dela. Arrumar um emprego... Ajudar a família...
    - Tchau mãe! Se cuida... - Dizia Sofia olhando para mãe que ia ficando pra trás, pela janela do trem.
    -Vou sentir saudades... - Respondia do outro lado a mãe, chorando.
    E assim se despediram, duas grandes mulheres. A mais velha que engravidou de Sofia. Foi expulsa de casa. Batalhou muito para não deixar os filhos morrerem. Após Sofia, teve mais três filhos. Todos homens e bem novos. Filhos de Sebastião um pescador de coração grande, eterno apaixonado por Rosa, a mãe de Sofia. E um pai fiel. Os dois sempre lutaram para sobreviver, a vida sempre se apresentou como uma megera, velha e sem encantos. Sofia já era mulher. Estava na hora de ajudar os pais. E lá se foi, de trem, para outro estado tentar ajudar a família. Chegou na estação desceu e esperou...
    - Você é Sofia? - Perguntou um velho magro e simpático.
    - Sim, e você deve ser o tio geraldo.
    - Isso mesmo. Olha a gente tambémé muito pobre...
    O tio geraldo explicou á Sofia que a vida também era dura com eles, que só ele trabalha de uma família de sete pessoas, e nãoporque eram vagabundos, mas porque, não eram estudados. Que moravam em uma casa pequena e apertada, mas deles. E que iriam tentar ajudá-la no que desse para arrumar um emprego, já que Sofia tinha educação completa, deficiente mas completa.
    Quando Sofia chegou, realmente viu como eram pobres, que as coisas não iam ser fáceis. Mas mesmo assim ela não sentia vontade de desistir, nem de virar mulher da vida, com viu acontecer com muitas de suas amigas. Garotas lindas, cheias de virtudes, legais mesmo de se conhecer. Mas como tudo que é tem que ser...Tiveram que se prostituir. Sofia lembrava de quando eram crianças, daquela felicidade inocente e sincera... E de suas amigas hoje, nas ruas... Bêbadas, semi-nuas. Maltratadas pelo tempo e pelo destino.
    - Veja, Sofia... Esse aqui é Pedro seu outro tio e a mulher dele Maria e seu filho Pedro...
    - Prazer - ela disse meio sem jeito.
    - Esse aqui é o vô Joaquim, e essa a vó Zefa... Esse aqui, mais novo é o thiago, meu filho. A mãe dele faleceu... teve uma doença, daí não aguentou...
    - Sinto muito.
    Thiago devia ter quase a mesma idade que Sofia, e parecia ser uma boa pessoa. Logo foi pegando as sacolas que ela trazia e levando pro fundos da casa...
    - Venha Sofia!
    Naquele dia, conversaram sobre quase tudo que podiam conversar. Sofia contou como era aonde morava, o que ela passava, e falava também dos sonhos que tinha... Thiago, falou das da cidade, das pessoas da vizinhança, de como para eles a também tava sendo muito difícil...
    - Você estuda Thiago?
    - Sim, numa escola pública do bairro aqui do lado. Eu reprovei três vezes já era pra eu ter terminado mas ainda estou na oitava série, e você?
    - Eu terminei ano passado, mas eu só passei mesmo porque os professores passavam...
    Os dois eram inteligentes e queriam estudar... Mas tinham que ajudar a família, tinha a fome que de vez em quando atingia... As doenças que pareciam tendência de moda pelo menos sete vezes no ano era gripe pra todo mundo. Sofia estava feliz, mesmo com aquilo tudo e ela queria era o que, o outro dia chegasse logo, para ela poder agir.
    Pena que o outro dia foi ficando para amanhã e amanhã e amanhã... Quando viu já tinha passado três meses e nem ela tinha conseguido ajudar a família dela, e ainda aumentou o número de bocas naquela casa. Até que ela consegiu o trabalho de doméstica, na casa de um advogado muito reconhecido, o doutor Wilson. Sem filhos e viúvo recentemente, andava meio depressivo... Ela varria a varanda quando Dr. Wilson perguntou...
    - Diga Sofia...
    - Dizer o que, Doutor?
    - Você é feliz?
    Sofia parou, ela ia dizer que não. Penso melhor e ia dizer que sim. Mas foi aí que acabou dizendo...
    - Sabe... A vida nunca me deu muitos motivos pra festejar, se é que a vida deu. Mas também, nem por não poder festejar eu me derrotei, e desisti. É como a frase de um cartoonista brasileiro... Cartoonista, doutor sabe o que é?
    - Sim eu sei, claro.
    - O senhor me perdoe mas é que eu achei que podia ter falado errado o nome...
    - Tudo bem, diga qual é a frase...
    - Bom, se eu errar é porque eu não estou bem lembrada mas é assim:
    Se não houver frutos, valeu a beleza das flores 
    Se não houver flores, valeu a sombra das folhas
    Se não houver folhas, valeu a intenção da semente...
    - Muito bonito.
    - E não é? A minha vida também é assim tipo essa metáfora...
    - Metáfora? E você sabe o que é isso ?
    - Sei sim doutor, pois eu tenho meus estudos completos. Então... Eu também tenho a vida assim, mesmo sem motivos pra festejar já vale a minha intenção em tentar ser feliz...
    - Muito bem, e como é que uma moça tão bem instruida, acabou se tornando minha doméstica?
    - Instruída nada. Não sei nada de acontecimentos históricos, nem sei fazer conta difícil, química e física então, nem sei pra onde vai...
    - Mas você é instruída no que mais importa... Na experiência. Você pelo visto, sabe VIVER. Tem gente Sofia, que morre e não descobre a metade que você sabe...
    Dr. Wilson viu que a Sofia era especial, era jovem e esperta, não ia deixar ela se perder naquela idade, resolveu ajudar. Pediu á Sofia que lhe falasse coisas da vida... Assim como quem num quer nada, conversa pós conversa, após meses de trabalho, tinha ficado pronto. Dr Wilson publicou na europa totalmente traduzido. Na Europa porquê eles compram conhecimento, porque eles gostam de ler, porque tem sede de cultura... E o nome do livro : A sabedoria de Sofia. Ele não pretendia ganhar dinheiro ás custas das idéias de Sofia. Inclusive o livro tinha como autor : Sofia Van, e como editor: Dr Wilson Vasconcelos. Todo o dinheiro do livro foi para uma poupança, para depois ser entregue á Sofia. E enquanto ela dormia naquele quarto escuro dos fundos, se protegendo do frio com um lençol fino... Do outro lado do oceano, era o seu nome o top que aparecia em todos os tablóides e críticas positivas. Logo, todos queriam ler o Sabedoria de Sofia 2, e queriam conhecer a tal autora misteriosa.
    Foi então que em uma tarde...
    - Sofia, venha cá!
    - Diga doutor Wilson.
    - Tá vendo este dinheiro?
    - Tou, sim senhor.
    - Pois pegue.
    - É pra eu depositar no banco para o senhor, ou pagar alguma dívida?
    - Não, Sofia. Este dinheiro é seu!
    - Meu?
    Explicou tudo que aconteceu até ali, que agora ela era famosa. E que na semana seguinte gostaria muito de viajar com ela para a Europa. Nem precisou explicar muito, Sofia já era grata por tudo. Dividiu o dinheiro entre o seu tio Geraldo e sua mãe... Arrumou as malas e estava para ir. Já estava no carro de Dr Wilson, indo pro aeroporto, quando lembrou de thiago. 
    - Dr. Wilson, a gente pode levar alguém com a gente?
    E na Europa, vinte e sete graus... Desceram Dr. Wilson, Thiago e Sofia Van, aclamada por alguns fãs que a esperavam no aeroporto e tinham muita curiosidade em vê-la. Sofia Van se formou em letras, e logo pôde publicar seus livros tanto na Europa quanto no Brasil... O difícil foi a língua estrangeira no início, mas Dr Wilson ajudava ela... Thiago desenhava bem, se tornou seu ilustrador. Seus livros andavam o mundo, em português, inglês, francês, alemão , chinês, indiano...Sua família já vivia bem melhor. tudo ia bem, até que anos depois, Dr. Wilson faleceu. E em seu discurso no enterro dele, Sofia disse:
    Se não houver recompensa, valeu o entusiasmo do trabalho.
    Se não houver realização, valeu a imaginação do sonho.
    Se não houver felicidade, valeu a nossa intenção de buscá-la...
    E Dr.Wilson, realmente a buscou... depositando em mim seus sonhos e seu trabalho. Eis sua recompensa e sua realização, e seu tão sonhado encontro com a felicidade...

    # Décimo Quarto -

    Minha vida é um entulho de todas as coisas que faço.
    De poesias que começo e não termino .
    De sonhos que não começo.
    De vontades que não realizo.
    De desejos que não satisfaço.
    De amores que vem e vão.
    De pessoas que vem e ficam.
    De lembranças que eu já nem lembro.
    De momentos que apareceram...
    Minha vida sempre foi um entulho de tudo que sou...